Os OVNIs se tornaram uma sensação moderna depois dos relatos de Kenneth Arnold sobre os discos voadores que ele testemunhou em 24 de junho de 1947. Um mês depois, em julho de 1947, ocorria o mais famoso evento sobre OVNIs da atualidade, a queda de uma nave extraterrestre em Roswell, no Novo México.

Entretanto, mais de um século antes, o Japão já documentava registros de misteriosas aparições por todo o país, e a mais famosa, intrigante e bem documentada delas é a Lenda do Utsurobune.

 

Em 1803, um grupo de pescadores da província de Hitachi ficou intrigado com uma misteriosa nave redonda que chegou à costa do Japão, parecia um barco de madeira descrito com quase 6 metros de largura e 4 metros de altura, ricamente decorado e adornado com placas de bronze em sua metade inferior e possuía várias janelas transparentes em sua metade superior e tal coisa teria sido altamente incomum aos olhos deles.

Espiando pelas janelas, os pescadores viram que as paredes estavam cobertas de textos estranhos escritos em uma língua desconhecida. Continha alimentos, roupas e uma bela mulher jovem, com uma pele muito pálida e cabelos surpreendentemente ruivos, trajando roupas elegantes e esvoaçantes de origem desconhecida e falando uma língua incompreensível, de modo que os pescadores não conseguiram se comunicar com ela, mas, apesar disso, ela permaneceu amigável e cortês. Ela carregava consigo uma misteriosa caixa que protegia dos pescadores, por mais insistentemente que eles indagassem sobre seu conteúdo.

Esta é história do “Utsurobune”, o “Navio Oco”, da província de Hitachi, encontrada em muitos registros do Período Edo, que remonta aos anos de 1603 até 1868.

Muitas tradições orais sobre os “navios ocos” são encontradas por todo o Japão durante esta época, e vários documentos descrevem o incidente de 1803 e incluem ilustrações de uma bela mulher e sua estranha caixa.

Oshuku Zakki, escrito em 1815 por Komai Norimura, um vassalo do poderoso daimyo Matsudaira Sadanobu.

Uma das fontes mais conhecidas é o Toen Shosetsu, as Histórias de Toen, uma coleção do ano de 1825 que registra histórias fantásticas e foi escrita pelo círculo literário Toenkai. Outros relatos são encontrados na obra Ume No Chiri, o Pó de Ameixa, escrita por Nagahashi Matajiro em 1844, e em outras coleções como Oshuku Zakki, as Notas de Oshuku, Hirokata Zuihitsu, os Ensaios de Hirokata, e no Hyoryuki-Shu, o Registro de Náufragos.

No total, existem pelo menos 11 documentos relacionados às histórias de Hitachi sobre o Utsurobune, dos quais as mais interessantes são as de 1803, o mesmo ano em que a misteriosa embarcação teria chegado à costa do Japão.

Mito ou Fato

A folclorista Yanagita Kunio disse certa vez que todas as lendas do Utsurobune eram ficções infundadas, mas no caso de Hitachi há uma diferença clara entre as outras lendas e mitos do país. O evento é registrado em todos os documentos como tendo ocorrido em uma data específica, o ano de 1803, e em um local específico, a província de Hitachi (atualmente chamada Ibaraki), ao contrário dos mitos que divergem ou não especificam datas e locais de sua ocorrência.

Outro fato é que existem inúmeras gravuras semelhantes da nave, mostrando que ela se assemelha muito a um disco voador e provavelmente a história descreve algo que realmente aconteceu.

Naquela época o Japão estava fechado para os estrangeiros. Após um breve período de contato com os navegadores europeus do século 16, os japoneses decidiram se isolar do resto do mundo a fim de preservar a sua cultura, então se houvesse um naufrágio de um navio ou pessoas estrangeiras tivessem chegado ao país, teria sido um grande evento e um funcionário do governo teria obrigatoriamente investigado e deixado um documento público. Quando os marinheiros britânicos chegaram em Otsuhama em 1824, o evento tornou-se uma das causas da publicação de um decreto para repelir navios estrangeiros.

Relatos de um Ninja

Uma das mais importantes descrições pode ser encontrada no Banke Bunsho, o Documento de Banke, de propriedade de Kawakami Jin’ichi, o herdeiro da tradição do ninjutsu Koka, pesquisador e artista marcial. Recebeu o nome do Banke, ou família Ban, do ninja Koka.

Este documento registra o local do ocorrido como Hitachihara Sharihama (Hitachi), um local real que aparece no mapa produzido pelo famoso cartógrafo Ino Tadataka, e sugere que um membro do Banke pode ter reunido informações enquanto trabalhava para o chefe do domínio Owari. “Nesse caso, ele não registraria nenhuma inverdade, por isso podemos dizer que o documento é muito confiável”, diz o pesquisador Tanaka Kazuo.

Ilustração do Mito Bunsho.

Outro registro é encontrado no Mito Bunsho, o Documento de Mito, de propriedade de um colecionador da cidade de Mito, na atual província de Ibaraki. Nele, o pesquisador Tanaka percebeu que as roupas da mulher em uma ilustração da obra eram semelhantes as de uma estátua de Bodhisattva, no Templo Shofukuji, também em Ibaraki, que é dedicado à criação de bichos-da-seda.

Uma lenda credita o início da sericultura na região à Princesa Konjiki, a “Princesa Dourada”, que é motivo de imagens no templo. Em uma versão da história, a Princesa Konjiki é levada para a costa japonesa após viajar em um barco em forma de casulo. Ela retribui a gentileza de um casal local, que tenta cuidar de sua saúde, dando-lhes os segredos da sericultura, quando ela mesma se torna um bicho-da-seda após sua morte. Entre os vários materiais, apenas a ilustração do Documento Mito parecia muito semelhante a da Princesa Konjiki.

Apesar de as descrições das roupas da mulher variarem ligeiramente de acordo com os documentos e o mesmo ocorrendo com o formato e o tamanho de sua embarcação, Tanaka afirma: “São todos referentes a um incidente que realmente aconteceu. Isso sugere que os escritores pelo menos acreditavam que o Utsurobune realmente apareceu na costa do Japão”.

O Registro de Náufragos, Hyoryuki-Shu, descreve a mulher como “tendo entre 18 e 20 anos, bem vestida e bonita. Seu rosto é pálido e suas sobrancelhas e cabelos são vermelhos. É impossível se comunicar com ela, então não está claro de onde ela é. Ela segura uma caixa de madeira simples como se fosse algo muito importante para ela e mantém distância. Há inscrições misteriosas no barco”.

Contatos Imediatos?

Muito da teoria OVNI sobre esta história vem dos desenhos e símbolos associados que foram registrados nos livros mencionados. Foi sugerido, com base em desenhos do navio, que poderia ter sido um OSNI (Objeto Submarino Não Identificado), e alegou-se que a aparência e os estranhos trajes da mulher poderiam ser explicados como os de um alienígena. Outros afirmam que há uma semelhança entre os símbolos não identificados que adornavam o interior do navio e aqueles que foram observados no casco da nave relatada no Incidente na Floresta de Rendlesham, na Inglaterra, em 1980.

Entre os inúmeros mistérios relacionados ao “navio oco”, o significado das enigmáticas inscrições pode nunca ser desvendado. Tanaka diz que uma teoria menciona que as inscrições assemelham-se às letras pseudo-romanas muitas vezes vistas na borda das gravuras ukiyo-e, um tipo de xilogravura e pintura que prosperou no Japão entre os séculos 17 e 19: “Portanto, pode ser simplesmente decorativo. Embora não seja impossível descobrirmos evidências de uma inscrição alienígena!”.